Apesar de Mercúrio estar mais próximo do Sol, Vênus é o planeta mais quente do Sistema Solar. A temperatura média na superfície é de 462 °C, suficiente para derreter o chumbo. Adicione a isso uma atmosfera densa, com 96,5% de dióxido de carbono, furacões e chuvas de ácido sulfúrico, e vai perceber que, em termos astronômicos, o inferno é bem aqui ao lado. Por coincidência, o planeta ficou conhecido pelos astrônomos da antiguidade como Ésperus – o anunciador da aurora, e por conseguinte teve seu nome associado a Lúcifer, o portador da luz. Só depois os romanos o batizaram em homenagem à Vênus, a deusa do amor e da beleza.

Agora, um estudo do Instituto Goddard de Ciências Espaciais (GISS), concluiu que as coisas nem sempre foram tão ruins em Vênus. Pelo contrário, a casa de Ésperus pode ter sustentado água líquida por dois ou três bilhões de anos, antes que o efeito estufa tivesse mudado drasticamente as condições da vida por lá.

Desde que há quarenta anos a missão Pioneer, da NASA, encontrou indícios bastante animadores de que o planeta pode ter abrigado um oceano, os cientistas se perguntam se Vênus poderia ter um clima estável capaz de suportar a água em estado líquido. Para tentar responder a esta e outras perguntas, o Dr. Michael Way e seu colega Anthony Del Genius, do GISS, criaram uma série de simulações, assumindo diferentes possíveis cenários da presença da água em Vênus. “Nossa hipótese é que Vênus pode ter abrigado um clima estável por bilhões de anos. É possível que um evento de aquecimento global da superfície seja responsável por sua transformação de um clima parecido com o da Terra para a estufa escaldante que observamos hoje ”, constata Way.

Mapas da superfície de Vênus indicam a existência de oceano de água

Mapeamento geotérmico do Planeta Vênus realizado pelo Programa Venera em 1981

Algo aconteceu em Vênus há setecentos milhões de anos. Uma enorme quantidade de dióxido de carbono foi liberada na atmosfera e não pôde ser reabsorvida pelos hipotéticos ecossistemas da superfície, causando a extinção do que se presume possa ter sido a vida planetária venusiana de então. Na Terra temos alguns exemplos dos efeitos da emissão de CO2 em larga escala, como a que ocorreu, por exemplo, na região da Sibéria há 500 milhões de anos. Um evento vulcânico que durou cerca de dois milhões de anos, estabelecendo o limite Permiano-Triássico, a primeira grande extinção. Semelhante fenômeno pode ter ocorrido em Vênus.

A equipe do Instituto Goddard realizou cinco simulações com base em diferentes níveis de cobertura de água na superfície de Vênus. Estas simulações incluíram um oceano com 310 metros de profundidade, outro medindo 10 metros, onde a água estava presa no solo, como na Terra, e um terceiro, no qual Vênus estava totalmente submerso, a uma profundidade de 158 metros.

As simulações foram realizadas através de modelos virtuais em três dimensões, variando as condições atmosféricas e os aumentos na radiação solar, para representar mudanças climáticas reais ao longo do tempo. Os período considerados nas simulações foram de 4,2 bilhões de anos atrás, 715 milhões de anos atrás, e hoje.

Cada simulação resultou num ambiente planetário com temperaturas entre 20 e 50 graus centígrados, onde a água pode existir na forma líquida. O mais curioso foi o fato de o experimento mostrar que Vênus pode ter sustentado essas temperaturas por até três bilhões de anos. Embora muitos pesquisadores acreditem que o planeta está além dos limites internos da zona habitável do Sistema Solar, e muito perto do Sol para suportar água líquida, o novo estudo sugere que esse pode não ser o caso. “Vênus atualmente tem quase o dobro da radiação solar que temos na Terra. No entanto, em todos os cenários que modelamos, descobrimos que o planeta ainda poderia suportar temperaturas de superfície favoráveis à água líquida ”, sustenta Way.

Para os paleo-astrônomos o estudo revela um horizonte bastante animador, considerando a hipótese de que Vênus pode ter hospedado toda uma variedade de espécies planetárias. Para o resto da humanidade representa um alerta aterrador, verificados os números mais recentes do aumento da temperatura global e suas consequências para o efeito estufa na Terra.

Vênus teve um processo de formação bastante semelhante ao da Terra.  Quando surgiu, há cerca de 4,2 bilhões de anos, o planeta esfriou rapidamente, capturando em sua crosta a maior parte do dióxido de carbono. Com uma atmosfera rica em nitrogênio e pequenas quantidades de dióxido de carbono e metano, podemos inferir que foi, em tempos longínquos, um planeta semelhante ao nosso.

O estudo sugere que há cerca de uns 750 milhões de anos, em razão da atividade vulcânica, uma enorme quantidade de gás de dióxido de carbono foi lançada na atmosfera de Vênus. Antes de esfriar, o magma expelido pelos vulcões formou um revestimento espesso da superfície do planeta, impedindo que o dióxido de carbono lançado na atmosfera fosse reabsorvido por ecossistemas vivos. O fenômeno desencadeou um efeito estufa descontrolado, que além de extinguir totalmente a vida venusiana, manteve grandes quantidades de dióxido de carbono na atmosfera, tornando-a mais espessa e quente até os dias atuais.

O estudo não é conclusivo, mas o Instituto Goddard de Ciências Espaciais ainda está procurando evidências sobre se a condensação da água em Vênus ocorreu num passado distante, e se a emissão de CO2 foi um evento único, ou se o aquecimento foi resultado de um longo e penoso processo de asfixia planetária. “Precisamos de mais missões para estudar Vênus e obter uma compreensão mais detalhada de sua história e evolução”, sustenta Way. “No entanto, nossos modelos mostram que existe uma possibilidade real de que Vênus possa ter sido habitável e radicalmente diferente da Vênus que observamos hoje. Isso abre todos os tipos de implicações para a observação dos exoplanetas encontrados nas chamadas ‘Zona Vênus’, que podem de fato hospedar água líquida e climas temperados” – em outros sistemas solares, acrescente-se.

Aspecto atual da superfície de Vênus com vulcão extinto ao fundo.

Publicado por vanaweb

Valério Azevedo nasceu na segunda metade do Século XX. O autor é, portanto, um baby-boomer. Cresceu assistindo televisão. Aos nove anos acompanhou, ao vivo, o homem caminhar pela primeira vez na superfície da Lua, porém sem cores. Há esse tempo, seriados de TV mostravam viajantes do espaço, do tempo e do fundo do mar combatendo monstros ameaçadores. Somente em 1973 a televisão no Brasil ganhou cores e ele passou a ver, sem assombro, negras silhuetas contra o céu azul despejarem a morte sobre a Indochina. Nessa época havia na casa dos seus avós um telefone que ele nunca usou. Anos mais tarde, em seu primeiro emprego, Valério conheceu o videoteipe. Invento extraordinário, que aprimorou a manipulação de imagens e sons, causando na narrativa audiovisual um sentimento algo instantâneo e urgente, e apaixonou-se por essa ideia. Pouco depois apareceram os primeiros computadores pessoais. Eles poderiam facilmente substituir máquinas de escrever e pilhas de papel, mas o autor os percebia apenas como brinquedos. Ele jogava xadrez com um deles e em sua esverdeada tela de fósforo encontrou inspiração para começar a escrever ficção. Com a chegada, no Brasil, do telefone celular e da rede mundial de computadores, em princípios dos anos 1990, a conexão entre as pessoas se intensificou incrivelmente. Ao mesmo tempo, a passagem de registros analógicos para digitais alterou de forma decisiva o modo de se produzir informação. Pouco depois da virada do milênio, o advento das redes sociais da internet foi o golpe de misericórdia na elaboração regulamentar de informações. Para o autor da página A Existência Virtual, “agora que os telefones fazem tudo, e até transmitem imagens e sons ao vivo, cada pessoa já pode se ocupar de espalhar sua precária e angustiada verdade, que a seguir se dissolverá como os entressonhos do alvorecer”. Então, decidiu retornar ao papel impresso, pois segundo ele, conforta-o a sensação do livro nas mãos e a ausência da barra de rolagem.

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