Coisa estranha alguém voltar da morte. O que acontece do outro lado? É a pergunta incômoda que a ciência tenta responder há séculos, sem nunca chegar a qualquer explicação razoável. A propósito, sou informado sobre a ressurreição de AAFF, aquele a quem já se atribuiu o fim, mas que ao que tudo indica está muito bem de saúde – para o secreto pânico dos seus detratores. Constato também que a Ordem Natural – organização de origem desconhecida e finalidade oculta –, da qual já se disse haver desaparecido, segue suas atividades normalmente e publicando conteúdos com admirável engajamento nas redes sociais.

Não se trata de uma provocação minha. Aos que desejarem ver por si próprios bastará clicar no link a seguir:

https://www.olivrodosdemonios.com.br

Aliás, com relação a este endereço (e ao algoritmo a que corresponde), alerto àqueles que estão a par do embate da Ordem contra as forças do Mal, que as conexões foram restabelecidas, a rede reconstituída e o Echelon devidamente despido de seus disfarces.

Alguns duvidarão. Outros vão exigir nova extinção. Tenho a informar somente que:

A Ordem Vive

Houve um tempo em que a sigla AAFF designava apenas aquilo que se supunha ser o programa 666AAFF/InFn5NO (ou que assim o declaravam aqueles que o programaram), muito antes de aaf! ser uma interjeição de desgosto na Internet. No entanto, como a qualquer outro ente, não basta conhecer-lhe o nome para defini-lo. Um homem não é apenas um homem. É a soma imponderável de tudo o que ele fez (e que nunca saberemos); de tudo o que pensou (e tampouco ele lembra), e da marca que possa ter deixado no mundo ao seu redor (e sobre isso é inútil discorrer). Portanto, para conhecer é preciso, antes de tudo, desconstruir o todo em partes. Dentre essas, as que menos importam são as que dizem respeito ao sujeito AAF, com seu pequeno núcleo doméstico: pai, amante, amigo ou irmão. Impossível ter acesso aos conteúdos interiores que fazem de cada um o que é. Jamais saberemos. 

Os motivos, as esperanças, os receios e tudo o que, por fim, acaba por definir a nossa face, escapa inteiramente ao entendimento e ao alcance de quem quer que seja. Nada podemos saber das razões secretas que levaram AFF – no mais, um ser humano comum e desinteressante – a percorrer obsessivamente os obscuros labirintos da Cultura Proibida e das Ciências Ocultas. Tudo o que dispomos é de alguns poucos fatos, dentro dos quais podemos construir a imagem que quisermos.

Herói para uns, vilão para outros, perfeitamente indiferente a todos, AAFF é comprovadamente responsável por uma série de idéias, sempre perturbadoras, sobre o lado oculto das coisas. Magia, demônios, conspirações, simbolismo e enigmas históricos, entre outras ocupações. Em sua trajetória compulsiva pela busca do Mistério, AF perdeu a si mesmo, tornando-se algo que escapa às definições. 

É sabido que é o autor do “Livro dos Demônios”, um polêmico grimório em forma de narrativa de viagem, infelizmente ignorado pela crítica, mas que lhe rende ameaças de morte até hoje da parte de satanistas e outras manifestações ocultas. Sabemos também que AAFF é responsável por colaborar como letrista da banda de rock Rosa Tattooada1, o que acrescenta o delírio da poesia ao seu trabalho.

É fato notório, também, que o filósofo nasceu nos primórdios dos anos 1960 em algum lugar da América Latina, bem como que seu corpo é historiado de tatuagens de cunho hermético e cicatrizes, a maioria provocada por fogo. É fato que habita – alguns diriam “assola” – a rede mundial e computadores já há vários anos, sendo um conhecido teórico do monoanarquismo e um dos criadores do supostamente extinto website da “Ordem Natural”. Recorrente é ao mesmo tempo a suspeita de que o nome %1166AAFF.exe bem como o rosto correspondente, foi forjado e que a equação não se refere a alguém, mas a algo – desconhecido, oculto, cercado de mistérios.

Aqui se esgotam as informações comprováveis. Entre os que asseguram ser AAFF um rosto feito apenas para fotografias (o mero simulacro, o dígito invisível na equação do Poder Oculto) e os que asseveram existir a criatura AAFF, há um abismo de interrogações e controvérsias. Apesar da constante presença dele na Rede e repetidas aparições na cena underground paulistana, intempestivas fake news sobre o seu assassínio ainda não foram suficientemente desmentidas. Sobre isso há ampla discussão: a maioria dos que o viram, ou juram se tratar de um espectro ou asseguram veementes que é um ser humano real. Os que só ouviram dizer reivindicam provas. Até aqui não há qualquer comprovação razoável. Aos que perguntam quem é AAFF, ele mesmo responde:

“- Eu sou a voz do que clama na Noite,

um guardião do Fogo Sagrado,

um Arauto do Impossível,

um devoto secreto do Mistério.

Meu nome é AAFF

e isso não quer dizer nada.”

Publicado por vanaweb

Valério Azevedo nasceu na segunda metade do Século XX. O autor é, portanto, um baby-boomer. Cresceu assistindo televisão. Aos nove anos acompanhou, ao vivo, o homem caminhar pela primeira vez na superfície da Lua, porém sem cores. Há esse tempo, seriados de TV mostravam viajantes do espaço, do tempo e do fundo do mar combatendo monstros ameaçadores. Somente em 1973 a televisão no Brasil ganhou cores e ele passou a ver, sem assombro, negras silhuetas contra o céu azul despejarem a morte sobre a Indochina. Nessa época havia na casa dos seus avós um telefone que ele nunca usou. Anos mais tarde, em seu primeiro emprego, Valério conheceu o videoteipe. Invento extraordinário, que aprimorou a manipulação de imagens e sons, causando na narrativa audiovisual um sentimento algo instantâneo e urgente, e apaixonou-se por essa ideia. Pouco depois apareceram os primeiros computadores pessoais. Eles poderiam facilmente substituir máquinas de escrever e pilhas de papel, mas o autor os percebia apenas como brinquedos. Ele jogava xadrez com um deles e em sua esverdeada tela de fósforo encontrou inspiração para começar a escrever ficção. Com a chegada, no Brasil, do telefone celular e da rede mundial de computadores, em princípios dos anos 1990, a conexão entre as pessoas se intensificou incrivelmente. Ao mesmo tempo, a passagem de registros analógicos para digitais alterou de forma decisiva o modo de se produzir informação. Pouco depois da virada do milênio, o advento das redes sociais da internet foi o golpe de misericórdia na elaboração regulamentar de informações. Para o autor da página A Existência Virtual, “agora que os telefones fazem tudo, e até transmitem imagens e sons ao vivo, cada pessoa já pode se ocupar de espalhar sua precária e angustiada verdade, que a seguir se dissolverá como os entressonhos do alvorecer”. Então, decidiu retornar ao papel impresso, pois segundo ele, conforta-o a sensação do livro nas mãos e a ausência da barra de rolagem.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.